Voltar ao topo | Alojamento: Blogs do SAPO
Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Amor e guerra (27)
Depois do inesquecível primeiro de Maio de 1974, os trabalhadores ganharam força, por uma vez, conseguiram desequilibrar o prato da balança a seu favor
Criaram comissões de trabalhadores, e os sindicatos exigiram melhores condições de trabalho e melhores renumerações, conseguindo bons aumentos de ordenado, o que fez com que o poder de compra ultrapassasse, em muito, a produção
As importações subiram em flecha, não havia supermercados, alguns bens de consumo escasseavam, nos talhos, a quem pedisse por favor, arranjavam meio frango, enquanto havia
Foi sol de pouca dura! Mas foi um tempo em que todos se sentiam gente
Foi uma primavera, onde todo o país floriu, havia uma alegria contagiante, foi como se tivéssemos saído da prisão
Em Luanda, as coisas iam de mal a pior: raptos, mortos, tiroteios, roubos
A Bárbara já tinha pedido ao Firmino para ter muito cuidado. Mas, ele continuava a dizer que tinha nascido em Luanda, que conhecia muito bem a cidade, que não tinha receio de nada
Parecia que ainda não tinha percebido, que tudo tinha mudado, que quem sempre tinha sido mandado, já não queria ser criado, sentia que a hora de mandar tinha chegado
Em contrapartida o Carlos estava muito feliz, por ter ao seu lado a mulher e o filho, de quem tanto gostava e que tanto apoio lhe davam
Estava muito contente com o novo emprego, ainda ficou mais, quando os sindicatos dos bancários conseguiram um aumento de dois mil escudos mensais. É caso para dizer que quem está ao pé do lume é que se aquece
Não havia um sistema de saúde, cada grupo profissional tinha o seu apoio médico:
Casas do povo, para os trabalhadores rurais, caixas dos pescadores, para os pescadores, para os outros havia caixas de previdência
As seguradoras tinham postos médicos, para atenderem os que tinham seguros de acidentes de trabalho
Depois do 25 de Abril, o sindicato dos bancários do sul e ilhas, que já tinha um posto médico, com especialidades escassas nos consultórios privados, como oftalmologia e médicos dentistas, que, nos consultórios, para se conseguir uma consulta, se tinha de meter uma cunha à empregada, que geria as marcações
Por isso, o Carlos sentia-se um privilegiado, no meio de tanta miséria, por todo o lado
Vivia-se um clima de reivindicações, depois de tanto tempo sem liberdade, todos queriam melhores condições de vida
Ocupavam-se casas devolutas, e o sindicato dos bancários ocupou um palacete, na rua Marquês de Fronteira, onde instalou um centro clínico
Foram dias loucos, difíceis de descrever, que, nem quem passou por eles, os consegue entender
Em Luanda, o Firmino saiu para ir visitar os clientes, como fazia todos os dias, mas não voltou para casa, passaram dois dias e a família não sabiam nada dele
Estavam, todos, muito preocupados temendo o pior, desde que se começou a falar na independência de Angola, que a cidade se tornou num barril de pólvora, onde tudo podia acontecer.
Continua.
Mazelas da Guerra
Continuação
Novo Ano
O ano de 1970 começa com nuvens muito negras. Tinha chegado aos ouvidos do Comandante de Batalhão, de que, na nossa Companhia, tinham brincado com a religião
Punidos com 5 e 10 dias de prisão, para Capitão e Furriel Vagomestre, respetivamente, por terem brincado com a religião
Tiveram de abandonar a Companhia, tendo a substituição recaído, no caso do Capitão, na escolha de um Capitão já a caminhar para a reforma, que estava a poucos meses de acabar a comissão
Foi um grande choque, já nos tínhamos esquecido do que tinha acontecido
Penso que a escolha, daquele Capitão, teve a ver com o facto de dentro de poucos meses deixarmos aquele acampamento, para irmos para o centro de Angola
Ainda bem que escolheram um militar com muita experiência, porque a viagem, do Norte para Luanda, foi muito atribulada
Em Maquela do Zombo e na fronteira fazia-se muito contrabando
As lojas vendiam de tudo, desde porcelanas chinesas, toalhas de mesa bordadas, artesanato em madeira e marfim, até um sem número de outro objetos, que podíamos comprar, para oferecer às nossas mães, mulheres, namoradas
Não estávamos sensibilizados para o tráfico do marfim, nem para o extermínio dos elefantes, quase todos comprámos pulseiras em marfim, para além de outras peças em marfim e madeira, para oferecermos às nossas amadas
Poucos dias antes da Páscoa, recebemos ordens para nos prepararmos para seguir para Lunada. Sei que foi pela Páscoa, porque no domingo de Páscoa, fui com outros camaradas conhecer a bonita ilha do Mussulo, e comprámos uma melancia
Aproximava-se o dia da partida, tínhamos de levar tudo o que pertencia à Companhia, para isso tinham sido alugados 17 camiões civis
Feitas as contas ao combustível que deveríamos ter utilizado, tínhamos 1.000 litros de gasolina a mais, porque não fizemos tantas operações, quantos os relatórios, foram queimados
Depois de tudo estar carregado, partimos rumo a Maquela do Zombo, primeira paragem obrigatória
Mal parámos, fomos rodeados pela Pide, queriam ver as nossas malas, para verem se levava-mos contrabando
Mas, o Capitão não autorizou que abrissem nenhuma mala, dando ordem para seguirmos para Carmona, onde íamos almoçar
Chegados a Carmona, outra vez a Pide, para verem as malas
O Capitão, que já devia saber as que podiam ser abertas, autorizou que abrissem uma ou duas
Como, daquela cidade, tínhamos duas estradas para chegar a Lunda, uma considerada segura e outra onde poderíamos sofrer emboscadas, que foi a escolhida pelo Capitão, não sei se por ordem do Quartel-General
Assim, antes de irmos almoçar, avisou todos os condutores civis, por onde seguiríamos
Depois do almoço ficámos a saber que alguns condutores já tinham seguido pela outra estrada, fazendo com que o Capitão tivesse ficado muito preocupado, por ter deixado que a coluna se tivesse dividido em duas.
Continua
Bebes a 30 mil euros
O Covid19 a todos tem incomodado
Ninguém lhe passou ao lado!
Transformou o mundo em prisão
De repente o céu fechou
Não por umas horas ou dias
Mas por meses!
Muitos estavam em trânsito
Ficaram impedidos de voltar para casa
Só o poderão fazer, quando os aviões derem à asa
Neste invisível turbilhão
Cerca de uma centena de bebes
Nascidos na Ucrânia, ficaram à espera
Que os aviões voltem a voar
Que os comboios voltem a andar
Que os carros possam, as fronteiras, atravessar
A Ucrânia, devido ainda às ondas de choque
Da desagregação da antiga URSS
Tornou-se num grande exportador de bebes
As ucranianas alugam as sus barrigas, durante 9 meses, por 15 mil euros
Os outros 15 mil são para as clinicas
Onde os bebes esperam pelos seus pais
Com este vírus ficaram retidos
Impedidos de irem para os seus lares
Receberem o carinho de que tanto necessitam
Para um crescimento feliz
Permanecem nos seus berços, alinhados
Sem a distância recomendada, para evitar a contaminação
Mais parecendo uma linha de montagem, do que um berçário
Não sei se as clinicas vão exigir juros
Devido ao atraso na entrega
Enquanto as suas futuras famílias desesperam
Os bebes vão crescendo na espera
De que nasça um risonho dia.
José Silva Costa
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.