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As Crianças

por cheia, em 04.06.24

Crianças

Oiço o choro das crianças, que estão presas nas guerras

Oiço o choro das crianças, que estão a morrer nas guerras

Oiço a fome e a sede das crianças, envoltas no pó das guerras

Oiço o choro das crinaças, que têm medo 

Oiço a aflição das crianças, que não têm um brinquedo

Oiço os gritos das crianças a quem mataram toda a família

Oiço os passos das crianças, que deambulam no som das balas

Oiço o suplício do que estão a fazer a crianças, homens e mulheres

Oiço as crianças a pedirem uns minutos de silêncio para poderem dormir

Oiço as crianças a pedirem tréguas para poderem sorrir

Oiço as crianças a dizerem que ninguém ganha com guerras

Oiço o barulho do tempo perdido nas guerras

Oiço o barulho dos animais e até das feras mortas nas guerras

Oiço o mar revoltado por causa das guerras

Mas, ninguém dá ouvidos a ninguém!

 

José Silva Costa

 

 

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publicado às 07:49

O Natal

por cheia, em 02.10.20

Mazelas da Guerra

Continuação

O Natal de 1969

Para muitos era primeira consoada passada fora do calor familiar

Na guerra nunca nos faltou álcool, quanto a mim, responsável por muitos acidentes

Duas fábricas de cerveja trabalhavam 24 horas por dia, para que nunca faltasse cerveja, bem ou mal fermentada

Havia quem se gabasse de beber uma grade, 24 garrafas, de cervejas até ao almoço

Os oficiais e sargentos tinham direito, por mês, a adquirirem, a bom preço, 2 garras de bom uísque escocês, conhaque francês, para que nunca nos faltasse álcool

Quando chegaram as 24 horas do dia 24 de Dezembro de 1969, já estávamos quase todos alcoolizados

Depois de ter estado na messe de oficiais e sargentos, onde nos reunimos todos, incluindo as esposas dos Sargentos, para a noite da consoada, e aproveitámos para ouvir a mensagem de Natal, do Agostinho Neto, em que ele dizia, “ este é último Natal, que os colonialistas portugueses passam em Angola”

Pela meia-noite fui à caserna dos soldados, para dar um abraço aos elementos da minha secção

Deparei com um sofrimento inimaginável: choravam, abraçavam-se, como se o mudo estivesse a acabar

Abraçaram-me, choraram no meu ombro, tentei que percebessem que era um dia como outro qualquer, que também estava a sofrer, como eles, por não estar com a família, mulher e filha

Só quando o cansaço e o sono os chamou para a cama é que consegui sair de lá

Já tentei lembrar-me do Natal seguinte, mas não me consigo lembrar de nada, o que quer dizer, que não teve o dramatismo do primeiro Natal, passado em Angola.

O ano novo trouxe más notícias.

 

 

Continua

  

 

 

 

 

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publicado às 07:52


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