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Junho
O sol de Junho é diferente
Aquece-me a mente
Nasce cedo e põe-se tarde
Tem cheiro a verdade!
Já passou metade
O que é bom acaba depressa
Bebo-te de manhã à noite
Antes que arrefeças
Não creio em promessas
E, de políticos muito menos
Antes das eleições prometem tudo a todos
Mais Funcionários Públicos e aumentos
Para acomodar as raparigas e rapazes do partido
A dívida abaixo dos cem por cento do PIB
Prefiro o tempo!
Este Junho que nos levará ao Verão
Cujo calor amadurece o pão
Ver uma planície de trigo ondulante
Um rancho de ceifeiras trigueiras
A cantarem para espantar o calor
Pedirem ao aguadeiro, mais um cocharro de água
Porque o calor está insuportável
Desejando que a ceifa termine
Que chegue o dia da adiafa.
José Silva Costa
Luar ao Sul
Ceifeiras: papoilas ao vento a esvoaçar
Trigueiras, a perfumarem a planície
Cantam, para espantarem as dores
De corpo e faces tapadas, para enfrentarem o calor
Sob um sol escaldante, de foices em riste
Para desafiarem o vento levante
Quantas canseiras, para ver o pão nas eiras!
Mulheres determinadas, que cortam o sol com o regaço
Que sabem todo o circuito do pão:
Alqueivar, gradar, semear, mondar, ceifar, debulhar, limpar, moer, peneirar, amassar, tender,
O forno aquecer, para o pão cozer
Se soubessem, as voltas que a mão dá, até fazer do grão de trigo pão!
Não o estragariam, dando-lhe muita mais atenção
Há multidões de esfomeados, que nunca, o pão, verão
Acabada a ceifa, chega a adiafa, para suavizar o cansaço
Um dos trabalhos mais duros, que mulheres e homens
Enfrentaram, nos campos do Alentejo
Sob um sol ardente, de cortar a respiração!
José Silva Costa
Maio
Maio, mês de todas as flores e de todos os horrores
Das ceifeiras e das papoilas
Trigueiras ceifeiras, de rosto tapado, para se protegerem dos beijos do sol, das papoilas e das espigas
A ceifa parecia uma orquestra bem afinada, um espetáculo inesquecível
Um movimento com o céu parado: mãos, canudos e foices num movimento sincronizado
Formavam um harmonioso bailado, com as espigas a dançarem no ar abafado
Que tem por fim segar o trigo e coloca-lo no restolho, confortado
À espera de ir para a eira, para ser debulhado.
Ninguém mais verá a planície florida de moças e moços, papoilas e espigas douradas
Não. Não verão mais o mar de trigais, ondulando, pontuado, aqui e além, por papoilas vermelhas
Não. O Alentejo não será mais o celeiro de Portugal
Um sacrifício a que foi condenado
Mesmo que a terra gemesse e já nada desse
Gentes e terra foram condenadas, por não se submeterem
A uma ditadura odiada.
Foste libertado em Abril, mas floriste em Maio
Acabou a adiafa, gratificação que simbolizava o fim de um dos trabalhos mais penosos.
Corpos vergados ao sol escaldante, em movimentos de competição, para colherem o pão
Que bom que seria, que todos soubessem, quantas voltas das, até chegares à mesa!
José Silva Costa
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