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As férias

por cheia, em 23.10.20

As mazelas da guerra

Continuação

As férias

Não me consigo lembrar como fui do Audulo para o Alto Hama, ou Alto Uama, o grande entroncamento nacional das rodovias Transnacionais que fazem parte da Rede Rodoviária Transafricana, onde muitos pernoitam, para descansarem das longas viagens

Tenho uma vaga ideia de ter lá dormido, e no dia seguinte ter perguntado se alguém ia para Luanda, e se me dava boleia. Um senhor disse-me que ia para perto de Luanda, e eu disse-lhe que valia mais estar perto que longe

Um bom carro, boa velocidade e uma caçadeira a meu lado. Quando entrei no carro, ainda fiquei um pouco preocupado, sem saber para que serviria a caçadeira

Passados uns bons quilómetros, avistámos um animal, muito ao longe, abrandou e disparou, e mais umas quantas vezes, durante a viagem, sem que tenha acertado, acho que era mais o gosto de disparar

Quando chegou ao destino, vimos uma camioneta carregada de sacos de farinha, ele conhecia o condutor, sem sair do carro, perguntou-lhe se me podia levar, para Luanda

Foi sair do carro, entrar na camioneta, até parecia que estava tudo combinado!

Finalmente, em Luanda, para a minha primeira viagem de avião. Oito horas, das 24 às oito, sobre o Atlântico,  porque, devido à guerra, não podíamos sobrevoar os países africanos, foi uma ótima experiência

Em agosto de 1970, de férias na metrópole, ainda as férias iam a meio, recebi uma carta de um camarada, onde me dizia que a nossa Companhia tinha sido mobilizada para uma operação numa zona de minas, mas não eram de petróleo, uma viatura já tinha ido pelos ares

Como estava a preparar o lume, para um churrasco, a carta foi direitinha para o lume, para que não fosse mais uma preocupação para a minha mulher, que nunca soube da receção da mesma

No início das férias já tinha tido um percalço, em Angola nunca tive paludismo, mal cheguei a casa fiquei com paludismo: febre a chegar aos 40 graus, a transpirção era tanta, que a minha mulher estava constantemente a trocar os lencois

Enquanto a médica não veio, pedi-lhe  para chamar um enfermeiro, para me dar um injeção que baixasse a febre, já não aguentava mais,  uma temperatura tão alta 

A médica queria mandar-me para o Hospital Militar, eu não queria passar umas férias, que me custaram uma fortuna, paga a prestações, à TAP, para passar um mês com a mulher e a filha, no Hospital Militar, pedi-lhe que me receitasse uma injeção de resochina, o mais difícil foi encontrá-la, mas foi remédio santo

Ao contrário do que acontecia em Angola, que os dias pareciam meses, os 30 dias férias passaram a correr

Quando me despedi da minha filha, com 20 meses, que dizia, sempre, a quem se despedia dela, “até logo”, foram as palavras que durante mais tempo, mais martelaram a minha cabeça, porque no momento pensei, ou até nunca mais!

 

Continua

 

 

 

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publicado às 05:58


12 comentários

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De imsilva a 23.10.2020 às 09:42

Forte, texto forte como aliás a vida é.
Continuas a deixar-me agarrada aos teus relatos.
Tem um belo dia.
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De cheia a 23.10.2020 às 20:14

Agradeço as tuas amáveis palavras!

Feliz fim-de-semana!
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De Folhasdeluar a 23.10.2020 às 11:23

Tempos duros...em que não existia motivação nem motivo...para matar e para morrer...abraço e bom fim-de-semana
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De cheia a 23.10.2020 às 20:18

Sem dúvida! Felizmente, na guerra, nunca precisei de dar um tiro.

Feliz fim-de-semana

Um abraço
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De Anónimo a 25.10.2020 às 10:12

Sorte a sua. Mas quem como eu visitou o hospital das F.A. no Lumiar, pôde observar o que é a guerra. Aí sim, podemos ver o sofrimento de quem regressou estropiado fisicamente e também psicologicamente.Abraço
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De cheia a 25.10.2020 às 11:21

Sim! Tivemos muita sorte, porque a guerra não foi igual em todos os sítios, nem em todas as Colónias. Contaram-me que na Guiné, nalguns acampamentos, mal saíam dos abrigos, choviam balas e granadas de morteiro.

Bom domingo, um abraço,
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De Luísa de Sousa a 23.10.2020 às 12:32

Oh José, quanto passaste ... !
Gosto tanto destes teus relatos

Beijinhos
Feliz Dia
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De cheia a 23.10.2020 às 20:20

Muito obrigado pelas tuas amáveis palavras!

Feliz fim-de-semana

Beijinhos
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De MJP a 23.10.2020 às 13:02

Grata por tão generosa partilha, José!
Bom fim-de-semana!
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De cheia a 23.10.2020 às 20:23

Agradeço as encorajadoras palavras, Zé!

Feliz fim-de-semana!
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De Existe um Olhar a 27.10.2020 às 01:35

Continuo presa a estas aventuras

Um dia pode escrever um livro.
Boa noite José

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De cheia a 27.10.2020 às 09:24

Muito obrigado pelo incentivo.

Um feliz dia!

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