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105.
Cantiga
a este moto:
Quem ora soubesse
onde o Amor nasce,
que o semeasse
VOLTAS
D'amor e seus danos
me fiz lavrador;
semeava amor
e colhia enganos;
não vi, em meus anos,
homem que apanhasse
o que semeasse.
Vi terra florida
de lindos abrolhos,
lindos para os olhos,
duros para a vida;
mas a rês perdida
que tal erva pace
em forte hora nace.
Com quanto perdi,
trabalhava em vão;
se semeei grão,
grande dor colhi.
Amor nunca vi
que muito durasse,
que não magoasse.
Lisboa!
Fada, namorada
Em cada canto, em cada escada
A ver nascer o sol, na madrugada
Nos braços do mundo, por todos é admirada, por todos é beijada
Estrela mimada, feiticeira, namoradeira, a atrair gente de todo o lado
Num abraço encantado, vai ouvir o fado
O horizonte, por cima do monte, estrelado
Sobe a colina, saia rodada, como se fosse uma varina
No rescaldo da noitada, bebe o sol e vai para a Madragoa
É o sol que Lisboa abençoa
Uma gaivota voava, voava à procura duma canoa
Queria voltar ao mar, queria deixar Lisboa
Os barcos atracados aos cais são um fascínio
Para quem não consegue estar em lado nenhum
Para quem sonha fazer-se ao mar e pelo mundo viajar
Desfraldam-se as velas e o sonho
Em cada beijo um luar risonho
Como se o mundo fosse um lugar seguro e colorido
Cheio de coisas boas e muito florido
De mãos dadas, sem guerras nem bandidos, que não respeitam a vida
Que só pensam na vaidosa subida
Que não contam que, mais tarde ou mais cedo, terão uma triste descida
Que ninguém lhe perdoará as mortes, o sofrimento, a sangrenta ferida
Entre nações, entre povos, entre mulheres e homens uma guerra fratricida
Seria muito melhor, que conseguíssemos viver em paz e dividir a comida
Tentar que a vida seja menos dolorosa e muito mais divertida
José Silva Costa
15.
Trovas
a üa Dama
Dama d'estranho primor,
se vos for
pesada minha firmeza,
olhai não me deis tristeza,
porque a converto em amor.
Se cuidais de
me matar quando usais
de esquivança,
irei tomar por vingança
amar-vos cada vez mais.
Porém vosso pensamento,
como isento,
seguirá sua tenção
crendo que em tanta afeição
não haja acrescentamento.
Não creiais
que destarte vos façais
invencível;
que Amor sobre o impossível
amostra que pode mais.
Mas já da tenção que sigo
me desdigo;
que, se há tanto poder nele
também vós podeis mais qu'ele
neste mal que usais comigo.
Mas se for
o vosso poder maior
entre nós,
quem poderá mais que vós
se vós podeis mais que Amor?
Despois que, Dama, vos vi,
entendi
que perdera Amor seu preço;
pois o favor que lhe eu peço
vos pede ele para si.
Nem duvido
que não pode, de sentido,
resistir;
pois, em vez de vos ferir,
ficou, de vos ver,
ferido.
Mas, pois vossa vista e tal
em meu mal,
que posso de vós querer?
De maneira
que não é, na derradeira,
grande espanto,
que quem, Dama, vos quer tanto
que outro tanto de vós queira.
26.
Cantiga
à atençãode
Miraguarda
MOTO:
Ver, e mais guardar
de ver outro dia,
quem o acabaria ?
VOLTAS
Da lindeza vossa,
Dama, quem a vê,
impossível é
que guardar-se possa.
Se faz tanta mossa
ver-vos um só dia,
quem se guardaria?
Milhor deve ser
neste aventurar,
ver, e não guardar,
que guardar de ver.
Ver, e defender,
muito bom seria;
mas... quem poderia?
,
93.
Cantiga a esta cantiga alheia:
Tende-me mão nele
qu'um real me deve I
Voltas
Cum real de amor,
dous de confiança
e três de esperança
me foge o tredor.
Falso desamor
se encerra naquele
qu'um real me deve.
Pediu-mo emprestado,
não lhe quis penhor;
é mau pagador,
tendo-mo aferrado.
Cum cordel atado,
ao Tronco se leve,
qu'um real me deve.
Por esta travessa
se vai acolhendo;
ei-lo vai correndo,
fugindo a grã pressa.
Nesta mão e nessa
o falso s'atreve,
qu'um real me deve
a esta cantiga alheia:
Tende-me mão nele
qu'um real me deve I
Comprou-me amor
sem lhe fazer preço:
eu não lhe mereço
dar-me desfavor.
Dá-me tanta dor
que ando após ele
pelo que me deve.
Eu de cá bradando,
ele vai fugindo;
ele sempre rindo,
eu sempre chorando.
{El} de quando em quando
no amor s'atreve,
como que não deve.
A falar verdade,
ele já pagou;
mas inda ficou
devendo ametade.
Minha liberdade
é a que me deve:
só nela se atreve.
63.
Cantiga
a este mato seu:
Da alma, e de quanto tiver,
quero que me despojeis,
contanto que me deixeis
os olhos para vos ver.
VOLTAS
Cousa que este corpo não tem
que já não tenhais rendida;
depois de tirar-lhe a vida,
tirai-lhe a morte também.
Se mais tenho que perder
mais quero que me leveis,
cantento que me deixeis
os olhos para vos ver.
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