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Crescei, desejo meu, pois que a Ventura
Ja vos tẽe nos seus braços levantado;
Que a bella causa de que sois gerado
O mais ditoso fim vos assegura.
Se aspirais por ousado a tanta altura,
Não vos espante haver ao sol chegado;
Porque he de aguia Real vosso cuidado,
Que quanto mais o soffre, mais se apura.
Ánimo, coração; que o pensamento
Te póde inda fazer mais glorioso,
Sem que respeite a teu merecimento.
Que cresças inda mais he ja forçoso;
Porque se foi de ousado o teu intento,
Agora de atrevido he venturoso.
Correm turbas as águas deste rio,
Que as rapidas enchentes enturbárão;
Os florecidos campos se seccárão;
Intratavel se fez o valle e frio.
Passou, como o verão, o ardente estio;
Humas cousas por outras se trocárão:
Os fementidos fados ja deixárão
Do mundo o regimento, ou desvario.
Ja o tempo a ordem sua tẽe sabida;
O mundo não; mas anda tão confuso,
Que parece que delle Deos se esquece.
Casos, opiniões, natura, e uso,
Fazem que nos pareça desta vida
Que não ha nella mais do que parece.
Luís de Camões
Conversação doméstica affeiçoa,
Ora em fórma de limpa e sãa vontade,
Ora de huma amorosa piedade,
Sem olhar qualidade de pessoa.
Se despois, por ventura, vos magôa
Com desamor e pouca lealdade,
Logo vos faz mentira da verdade
O brando Amor, que tudo, em fim, perdoa,
Não são isto que fallo conjecturas
Que o pensamento julga na apparencia,
Por fazer delicadas escripturas.
Metida tenho a mão na consciencia,
E não fallo senão verdades puras
Que me ensinou a viva experiencia.
Luís de Camões
Contente vivi já, vendo-me isento
deste mal, de que a muitos queixar via.
Chamam-lhe amor; mas eu lhe chamaria
discórdia e sem-razão, guerra e tormento.
Enganou-me co nome o pensamento
(quem com tal nome não se enganaria?);
agora tal estou que temo um dia,
em que venha a faltar-me o sofrimento.
Com desesperação e com desejo
me paga o que por ele estou passando;
e inda está do meu mal mal satisfeito.
Pois sobre tantos danos inda vejo,
para dar-me outros mil, um olhar brando,
e para os não curar um duro peito.
Luís de Camões
Como quando do mar tempestuoso
O marinheiro todo trabalhado,
De hum naufragio cruel sahindo a nado,
Só de ouvir fallar nelle está medroso:
Firme jura que o vê-lo bonançoso
Do seu lar o não tire socegado;
Mas esquecido ja do horror passado,
Delle a fiar se torna cobiçoso:
Assi, Senhora, eu que da tormenta
De vossa vista fujo, por salvar-me,
Jurando de não mais em outra ver-me;
Com a alma que de vós nunca se ausenta,
Me tórno, por cobiça de ganhar-me,
Onde estive tão perto de perder-me.
Luís de Camões
Como podes (oh cego peccador!)
Estar em teus errores tão isento,
Sabendo que esta vida he hum momento,
Se comparada com a eterna for?
Não cuides tu que o justo Julgador
Deixará tuas culpas sem tormento,
Nem que passando vai o tempo lento
Do dia de horrendíssimo pavor.
Não gastes horas, dias, mezes, anos,
Em seguir de teus damnos a amisade
De que despois resultão mores danos.
E pois de teus enganos a verdade
Conheces, deixa ja tantos enganos,
Pedindo a Deos perdão com humildade.
O brinde ao empate entre PSD e PS.
- Como fizeste, ó Porcia, tal ferida?
Foi voluntaria, ou foi por inocência?
- É que Amor fazer só quiz exp'riencia
Se podia eu sofrer tirar-me a vida.
- E com teu proprio sangue te convida
A que faças á morte resistencia?
- É que costume faço da paciencia,
Po rque o temor morrer me não impida.
- Pois porque estás comendo fogo ardente,
Se a ferro te costumas? É que ordena
Amor que morra, e pene juntamente.
- E tens a dor do ferro por pequena?
- Sim, que a dor costumada não se sente;
E não quero eu a morte sem a pena.
Luís de Camões
Chorai, Ninfas, os fados poderosos
daquela soberana fermosura!
Onde foram parar ? Na sepultura?
aqueles reais olhos graciosos?
Ó bens do mundo, falsos e enganosos!
Que mágoas para ouvir! Que tal figura
Jaza sem resplendor na terra dura,
Com tal rostro e cabelos tão fermosos!
Das outras que será, pois poder teve
A morte sobre cousa tanto bela
Que ela eclipsava a luz do claro dia?
Mas o mundo não era digno dela;
Por isso mais na terra não esteve:
Ao Céu subiu, que já se lhe devia.
Luís de Camões
Cantando estava um dia bem seguro,
Quando passava Silvio, e me dizia:
(Silvio, pastor antiguo que sabia
Por o canto das aves o futuro)
"Méries, quando quizer o Fado escuro,
A oprimir-te virão em um só dia
Dois lobos; logo a voz e a melodia
Te fugirão, e o som suave e puro."
Bem foi assi; porque hum me degolou
Quanto gado vacum pastava e tinha,
De que grandes soldadas esperava.
E, por mais dano, o outro me matou
A cordeira gentil, que eu tanto amava,
Perpétua saudade da alma minha!
Luís de Camões
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